domingo, 30 de maio de 2010

O ESPIRITO DA LEI: artigo de Paulo Delgado

Hoje, 18 de maio é o Dia Nacional da Luta Antimanicomial, data que comemora em todo o país, o trabalho de todos aqueles que querem uma sociedade sem exclusão, interdição, preconceito e desrespeito às pessoas que padecem de sofrimento mental. Foram eles que impulsionaram o debate dessa questão que culminou em 6 de abril de 2001 com a aprovação da Lei 10.216 de minha autoria que “Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental”.

Cuidado: substantivo, adjetivo ou interjeição é zelo dos preocupados, dedicação,proteção. Atenção, tomar conta, acolher. Cuidado é o princípio que norteia essa lei. Evoluir a clínica, fazer do intratável o tratável. É essencial o apoio social e familiar que influencie comportamentos, mude hábitos, confronte preconceitos. Dedicada a cidadãos enfermos vistos como sem vontade, não é a doença mental que a lei questiona, mas a maneira de tratá-la.

A sociedade faz-se progressista na área de saúde por atitudes, mais do que por atos e quando aceita inscrever o doente mental na história da saúde pública. A doença mental não é contagiosa, dispensa isolamento. É o avanço da medicina que permite a reinserção social, restitui o indivíduo, sua alma e desejos, ao mundo dos vivos livrando-o do ambiente carceral.

Acolhimento,tratamento precoce melhoram o acompanhamento da doença. Agir antes do surto para não ferir. Sintomas físicos, queixas, mal-estar, sempre foram indícios de várias enfermidades. Estar atento à escuta geral dos sintomas – embrulho dos orgãos, ruídos da adolescência, álcool, droga, conflito de gerações, esquisitices, vazio existencial, impaciência com o diferente. A doença não é um fracasso nem produz estatuto de exilado. A internação é uma parte do tratamento, mas não seu sinônimo e o conceito de leito, nesse caso, não se harmoniza com a terapia adequada. A internação como privação da liberdade, monoterapia, só prevalece em serviços despreparados.

Enfim, todos os doentes são beneficiários do ambiente jurídico oriundo da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão.

“Se eu soubesse de alguma coisa útil à minha nação que fosse danosa a uma outra, eu não a proporia, porque sou homem antes de ser nacional ou ainda porque sou necessariamente homem, não sendo nacional senão por acaso. Se soubesse de alguma coisa que me fosse útil e prejudicial à minha família, meu espírito a rejeitaria. Se soubesse que alguma coisa que fosse útil à minha família e que não o fosse à minha pátria, buscaria esquecê-la. Se soubesse de alguma coisa que fosse útil à minha pátria e que fosse prejudicial ao meu continente ou que fosse útil ao meu continente e prejudicial ao gênero humano, eu a veria como um crime”. É de Montesquieu o espírito da lei.

Paulo Delgado é Deputado Federal pelo PT-MG desde a Constituinte

Postado em BLOG DO NOBLAT (O GLOBO/1805/2010)

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