Pela segunda vez consecutiva, próximo à celebração do Dia Nacional de Luta Antimanicomial – 18 de Maio –, Ferreira Gullar, o (e)terno poeta do "Poema Sujo", escreve um artigo, na Folha de São Paulo, com argumentos rasos e preconceituosos sobre a lei Paulo Delgado e a Reforma Psiquiátrica brasileira.Ferreira Gullar, finalmente, revela que tem dois filhos em sofrimento psíquico grave. Relato de familiares que envolvem a vida e os afetos privados, tornados públicos sensibilizam do leigo aos trabalhadores de saúde que lidam com tais experiências. Em comum a impotência gerada pela falta de serviços acolhedores e resolutivos, cujos números expressivos ainda estão longe de realizar a cobertura desejada. As razões pelas quais convivemos com esse quadro devem ser objeto de uma corajosa análise, estado por estado, município por município, além da responsabilidade federal. Porém, revogar a lei Paulo Delgado é reduzir de modo simplista a solução requerida para o atual estágio da assistência à saúde mental no Brasil.Entre a dor de um pai que reclama por mais e melhores serviços de saúde mental no país – dos serviços substitutivos ao manicômio aos leitos psiquiátricos em hospitais gerais, ambos em quantidades deficitárias diante do número de leitos psiquiátricos fechados desde meados dos anos 1980 – e simplesmente revogar a lei que coroou a mais profunda reforma psiquiátrica existe um abismo político ideológico.Os argumentos do poeta Ferreira Gullar no caderno "Ilustrada" da Folha de São Paulo deste domingo, se deixam de lado o enfrentamento histórico com a psiquiatria conservadora para com argumentos rasos e preconceituosos pedir a revogação da lei Paulo Delgado que mudou o cenário trágico da assistência psiquiátrica brasileira, escancaram, por outro, a falta de investimentos para a efetiva consolidação de um modelo que se quer substitutivo. Sem estes, ficam comprometidas as iniciativas de criar um outro lugar para a loucura em nossa sociedade, lugar cuja construção não cessa.De nada adianta invocar que atual lógica da política de saúde mental se sustenta sob a prática do cuidado em liberdade, se a desinstitucionalização da loucura, em muitos lugares, vem se dando na sua vertente mais pobre: a desospitalização; se não há recursos sequer para promover um amplo processo de conversão dos recursos humanos existentes na rede pública de saúde ao novo modelo de atenção em saúde mental vigente no país, sem os quais a reforma patina.Neste cenário, não há porque lamentar as inúmeras tentativas de desmonte e do isolamento do movimento social por uma sociedade sem manicômios. Os conservadores o fazem abertamente; sabemos quem são e o que representam socialmente. Falta-nos a dimensão crítica da institucionalização da reforma psiquiátrica no curso do processo histórico. É preciso ir à luta. Que vem chumbo grosso por aí!
Comentário de Rogélio Casado
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