quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

CASOS CRÔNICOS: Por que se tornaram crônicos? Ou a cronicidade é apenas uma forma de olhar.

Meu leitor (obrigada!) Carlos Saraiva nos pergunta se nos casos crônicos, ou a pessoa não aceita tratamento, e a família em desgaste prende-o dentro de um manicômio, abandona-o. Eis o recente censo da cidade de São Paulo com milhares de pessoas se tornando moradoras dos hospitais psiquiátricos, apesar dos oito anos de implantação da reforma psiquiátrica, é de se imaginar que por lá predominem aqueles que defendem a psiquiatria manicomial. Professora Lúcia Rosa, autora de Transtorno Mental e Cuidado na Família, fala muitos em suas aulas, que a família não abandona, ela acredita que quem estudou está lá, ela confia de alguma maneira na função terapêutica do hospital. Espera que de algum modo seu ente querido retorne para casa recuperado. O censo de São Paulo aponta que muitos pacientes moram no hospital por pauperização, muitos sem diagnósticos psiquiátricos. Para que pessoas treinadas em artes marciais dentro de uma instituição "totalitária", que apaga identidades. Lembro de uma paciente que me dizia que lá dentro até o sol era diferente. Para separar brigas entre agudos, aí lembro, do livro Estranho no Ninho. Os crônicos já sabem as regras. Passei três anos como estagiária no plantão de urgência do HAA, o caos aparente do surto, tem uma ordem cotidiana. As pessoas estão presas, muitas judicialmente pagando suas penas ali. Só se pensa nos normais, em vez de curso de defesa e ataque poderia-se está criando quartos de encontros íntimos para os casais psicóticos que ali moram ou passam muito tempo internados, junto com orientação de sexo seguro ( uso de preservativos, etc), essas pessoas poderiam ficar mais calmas. Isto é um absurdo?
Absurdo é a cronicidade do olhar. Sempre que volto ao hospital, os olhares são bem interessantes, duas graduações, aprovações em dois concursos públicos, publicação de textos científicos e literários, depois de surtos psicóticos agudos, é difícil acreditar. Mais é possível.Defendo a loucura enquanto condição de existência, depois que li sobre reabilitação psicossocial. Só não acho interessante cultuar a crise. Se você tem problemas emocionais e toma álcool com carbolítium porque é bipolar, é complicado. Melhor cuidar das questões emocionais com psicoterapia. Então, os sintomas ficarão mais fáceis de entrar em remissão.Toma-se o álcool, e se continuar não dando certo, melhor aprender viver com essa limitação. Deixar de ser parente da Família Adans; olhar o mar maravilhoso e sentir infeliz por isso ou porque fez um sol gostoso. Não sei se te respondi amigo, mas é possível aceitar a loucura responsável do outro. Esse tipo de loucura existe.

Um comentário:

Anônimo disse...

Não sou a favor de manicomios, nem de violência e nem da loucura talvez. Mas o mundo não é para os cronicos, a psicoterapia é limitada, tudo se resolve no "si" mas depois o mundo lá fora se torna muito complicado. A internação aqui em São Paulo é feita no máximo 3 meses enquanto houver risco de vida para o paciente. Muitos tem capacidade mental diminuida devido a problemas, olhar todos igualmente como "você pode superar isso" é talvez querer fazer a pessoa morrer. O problema mais grave dos dias de hoje é a banalização de medicamentos e diagnosticos, a ansia de fazer todos sentirem-se bem e pronto para uma vida produtiva esta fazendo uma nova geração de "drogados". Mas porque não repensar no "manicomio" como espaços para quem tem problemas se expressarem? Seria muito melhor do que enfiarem "loucos" em supermercado empacotando compras ou isolados em casa sob o rotulo "esta aqui por que o amamos". Nada mais humano do que se expressar, nada mais humano que ter um lugar onde se permite respirar. Queremos tirar o "louco" de um lado ruim e coloca-lo no outro nada promissor, do social enferrujado e hipocrita. Culpamos o ocio mas na verdade é essa pressão de existir que nos deixa ansiosos. E se no mundo não pode existir ou existe como apenas uma coisa inferior, não ficamos longe de uma depressão. Nisso que sempre pensei, em um lugar onde se possa existir longe da "tralha" tão cultuada pelo "normais".

PSIQUIATRIA SEM HOSPÍCIO

POR UMA CLÍNICA DA REFORMA PSIQUIÁTRICA: COM SUBJETIVIDADE, MEDICAÇÃO COM MENOS EFEITOS COLATERAIS E MAIOR PODER DE RESOLUTIVIDADE ASSOCIADA A PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES.